No evangelho de São Lucas, Jesus diz: "Guardai-vos escrupulosamente de toda avareza, porque a vida de um homem, ainda que ele esteja na abundância, não depende de suas riquezas" (12,13). E logo depois Ele conta a parábola de um homem bastante rico que não tem onde recolher sua plantação. Esse homem, que já tem um celeiro e deseja fazer um celeiro ainda maior - no qual porá todos os seus bens e depois descansará - é chamado por Deus de insensato.

A avareza

Quando começamos a ler essa parábola, encontramos uma palavra muito forte: "escrupulosamente". Jesus aqui está falando de uma idolatria, que se chama avareza.

E São Paulo vai nos dizer: "Que terrível idolatria é a avareza". Quando Lucas mantém a palavra "escrupulosamente" é porque Jesus está falando de uma coisa muito séria, da qual depende perder ou ganhar a alma, ir para o céu ou para o inferno.

A idolatria ao dinheiro pode levar o homem ao inferno. E quando falamos em dinheiro, não falamos apenas de dólar, real ou lira, mas daquilo que possuímos, daquilo que temos. E do risco que corremos de entesourar, como esse homem da parábola fez: ele já tinha um celeiro, mas construiu um maior. Ele não pensou em repartir a herança com os pobres.

Assim somos nós! Eu tenho roupa suficiente, mas se ganho dinheiro, não penso em repartir com os pobres, penso em ter mais roupas, embora eu não precise. Já tenho meu carro, mas se ganho dinheiro, penso em comprar um carro melhor, outro carro; não me passa pela cabeça que aquele dinheiro me foi dado para repartir com os pobres. Porque a idolatria dos bens, do dinheiro, me faz juntar casa a casa, comprar uma casa mais luxuosa, um carro mais luxuoso, uma roupa desnecessária, um móvel desnecessário, uma casa desnecessária.

E o salmo 148 diz: "Quando um homem se torna muito rico, aumenta o luxo de sua casa. Morrendo, ele nada levará consigo e a sua fortuna não descerá com ele aos infernos".

Jesus fala, portanto, de uma questão de salvação. Vejamos o que diz Santa Teresa: "Escutai, vós que desejais possuir riquezas, ter posses: apoiar-se sobre as riquezas é apoiar-se sobre o ferro em brasa". E João Paulo II diz: "Entre as exigências de renúncia que Jesus propõe aos seus discípulos - não é uma opção ou uma escolha, é uma exigência - figura a renúncia aos bens terrenos, e em particular às riquezas". É uma exigência dirigida a todos os cristãos e que se refere ao espírito de pobreza, isto é, o desapego aos bens terrenos, desapego que nos faz ser generosos para reparti-los com os outros.

A avareza, a idolatria dos bens, é oposta ao evangelho. Nós todos deveríamos ter isso na cabeça, porque encontramos muitas desculpas para não nos despojarmos, para não imitar Jesus, para não partilhar os nossos bens.

A pobreza espiritual

São Francisco de Sales diz uma coisa muito interessante: "Quando o fogo do amor está em um coração, todos os móveis voam pela janela". Porque o meu coração se despoja, dá. Você quer saber se o fogo do amor está em seu coração, se você ama a Deus? Abra a janela da sua casa, se os móveis voarem pela janela, é sinal que você ama a Deus; se os móveis continuarem presos ao chão, é sinal que você não ama a Deus.

Quando São Francisco de Sales dizia isso, no século XVI, os móveis eram pesadíssimos, não eram como os nossos hoje que são levíssimos, e até esses ficam pregados.

Muitas vezes eu penso que nós não temos ainda nossa sede própria do Shalom, que nós não trabalhamos ainda com os pobres como deveríamos trabalhar - aliás, não penso, tenho certeza - porque os nossos móveis ainda não voaram pela janela, porque o amor de Deus não é ainda grande no meu coração, a ponto dos meus móveis, carros, carruagens, roupas saírem voando janela afora, eu ainda quero mais. Ainda me apego ao que tenho, e se me derem mais algum dinheiro eu compro mais daquilo que tenho, ou coloco numa poupança que já tenho para garantir meu futuro. E isso garante meu futuro, no inferno.

Outra coisa que João Paulo II ensina: "A pobreza é um compromisso de vida inspirada pela fé e pelo amor a Cristo". Quem inspira a pobreza não são os estatutos, não é o formador ou esse ou aquele santo, não é um pobre que está no meio da rua, não é um livro bonito, é a fé e o amor a Jesus Cristo. O Papa diz mais: "É o Espírito que exige também uma prática. O espírito de pobreza vale para todos e cada um necessita colocá-lo em prática, de acordo com o evangelho". O espírito de pobreza vale para todos!

Quando nos deparamos com a ordem de Jesus: "Guardai-vos escrupulosamente da avareza", ou seja, guardai-vos de ter casa sobre casa, bens sobre bens, celeiros sobre celeiros, às vezes podemos dizer: "Ah, mas eu sou um homem de negócios, tenho de prosperar". O que é, de fato, prosperidade? Qual o espírito capitalista, consumista que te move? Certamente, não é o espírito do evangelho.
O espírito do evangelho não é um espírito capitalista, nem consumista; é um espírito de partilha. Não é também um espírito comunista, nem socialista; é um espírito de partilha, de comunhão de bens. Os bens são divididos e não acumulados ou socializados ou unificados. Partilhados por amor, e não divididos por uma imposição do Estado.

O espírito de partilha do evangelho não é conivente com o capitalismo nem com o socialismo nem com o consumismo nem com o neoliberalismo ou o nome que você quiser dar. O homem nunca encontrou o que está óbvio no evangelho: "A salvação da alma do homem, a salvação da sociedade, a paz da humanidade vem pelo espírito evangélico de partilha". E nós, que somos a comunidade da paz, para promovermos a paz entre os povos, entre as nações, precisamos viver para depois pregar o espírito evangélico de partilha, independente de qualquer sistema econômico.

Precisamos viver independentes do sistema econômico no qual estamos, seja ele qual for. Porque aí poderei ir do Brasil para a África, de Xangai para a Groenlândia, posso ir para Macau ou para Brasília. Onde eu estiver estou livre, seja do comunismo, seja do capitalismo, seja do socialismo, seja do neoliberalismo; sou livre porque vivo a partilha, a comunhão de bens. Vivo a partilha que vem do amor a Jesus.

Cada vez mais precisaremos viver essa pobreza de que fala o Papa, para podermos pregar o evangelho. Se não, seremos como o sepulcro caiado, que por fora é bonito, mas por dentro é cheio de podridão.

O Frei Cantalamessa, baseando-se no pensamento de Santo Agostinho, diz que o espírito de pobreza não se entende quando se tem por base o tempo: "Eu creio que não haja palavra mais urgente para trazer-se presente na vida do que a palavra eternidade". Porque quando digo "eternidade", todos os bens se relativizam. Tudo fica relativo.

O demônio nos prende a este tempo, a este lugar, a estas pessoas, a estes bens, a estas posses, aqui e agora. Deus nos liberta destes bens, deste mundo, desta vida, destas pessoas para a eternidade. Então, se o meu ponto de vista é a eternidade, minha vida será livre dos bens, não vou ser um idólatra do dinheiro nem das preocupações com os bens, não vou ser um idólatra do ter sempre mais nem deste ou daquele sistema. Vou estar livre, porque quando o meu referencial é a eternidade, tudo se torna ínfimo, tudo se torna muito pequeno.

Você pode se perguntar: "Nestes dias, meu Deus, com o que tenho me preocupado mais: com a eternidade ou com o que vou comer? Com a eternidade ou com o que tenho ganho? Com a eternidade ou com o que tenho que pagar? Com a eternidade ou com o que tenho que vestir?
Santo Agostinho diz: "À luz da eternidade, o rico parece um pobre mendicante, que teve uma noite só um belíssimo sonho; sonha que choveu sobre ele do céu uma grande herança. No sonho, vê-se recoberto de vestes esplendorosas, circundado de peças de ouro e prata, possuidor de campos e vinhas. No seu orgulho, despreza até seu pai, e faz de conta que não o reconhece. Mas eis que pela manhã, este homem levanta-se e se vê com um punhado de moscas nas mãos". O que ele quer dizer? Quando tenho em mira a eternidade, o homem mais rico entre os ricos é como um pobre mendigo, que sonha que ficou rico de repente.

Os celeiros

Em Fortaleza, o Pe. Daniel-Ange falou sobre a pretensão que temos de acumular nos celeiros e que queremos acumular cada vez mais os nossos celeiros, o luxo que queremos aumentar dos móveis que nunca voaram pela janela. O luxo que aumento nos meus carros, o luxo que aumento em minhas roupas, e não partilho com uma criança que está rua. Porque dá trabalho, porque é um viciado, porque hoje dou dinheiro e amanhã e ele volta para a rua. Porque se eu for fazer o serviço bem feito, vou ter de me meter "lá onde Judas perdeu as botas", conhecer a família dele, cuidar da escola dele, isso dá muito trabalho e eu sou muito ocupado!

Na minha Bíblia tem uma parábola que fala que um passa muito apressado porque tem de ir para o Templo, outro passa muito apressado porque vai resolver os seus negócios, e só o samaritano pára e socorre o homem que está no chão. Nós precisamos crescer no amor ao evangelho, na coerência, no chamado à pobreza evangélica, que, como ouvimos João Paulo II dizer, é para todos. É um dever, um compromisso de todos.

Quando Jesus diz: "Guardai-vos escrupulosamente da avareza", Ele está falando de céu ou inferno, de vida eterna ou perdição eterna.

Na mesma passagem de Lucas 12, no versículo 20: "Deus, porém, lhe diz: 'Insensato, nesta mesma noite, ser-te-á reclamada a alma. E as coisas que ajuntaste, de quem serão?' Assim acontece ao homem que entesoura para si mesmo e não é rico para Deus".

O profeta Isaías fala da pobreza espiritual: "Deus é um refúgio para o fraco, refúgio para o pobre em sua tribulação". Deus não é refúgio para o forte porque o forte não precisa de refúgio. O que pode tudo neste mundo não precisa de refúgio.

Às vezes alguém diz: "Ah, eu tenho cinco apartamentos, doze carros, dez fazendas... mas sou pobre de espírito, porque estou abandonado nas mãos de Deus". Não está! Se você tem cinco apartamentos, doze carros, dez fazendas, não diga que está abandonado nas mãos de Deus, não se iluda! Agora, se você tem isso e reduz ao mínimo que você precisa, e o resto partilha com os pobres, aí você pode seguir Jesus. Se você fica com o que é necessário para viver, e o resto partilha com os pobres, aí você é pobre de espírito.

Se você não restringe o que tem ao necessário para viver, você ainda não será pobre em espírito, porque ainda estará ajuntando bens sobre bens. É preciso coragem de partilhar, coragem de dar, a coragem que vem do amor. É dever nosso, como batizados, viver com o que precisamos, e não ter mais do que precisamos. É dever nosso dar o que não precisamos, partilhar o que não precisamos. Isso é uma graça, a graça da pobreza espiritual, a graça do abandono nas mãos de Deus. Isso é para homens e mulheres convertidos, homens e mulheres de coragem, que vivam o evangelho.

Olha o que diz João Paulo II sobre a pobreza de espírito: "Pobres de espírito são aqueles que, carecendo de bens terrestres, sabem viver com dignidade humana os valores de uma pobreza espiritual rica de Deus. E pobres de espírito são aqueles que, possuindo bens materiais, vivem o desprendimento interior e a partilha de bens com os que sofrem necessidades".

São Francisco vai mais a fundo: "Muitos há que são devotos na oração, são fortes no culto divino, praticam muito a abstinência, a mortificação corporal, mas por causa de uma única palavra que lhes possa ferir o próprio eu, ou por causa de algum bem que se lhes tire, logo se mostram escandalizados e ficam perturbados. Estes não são pobres de espírito, não odeiam a si mesmos e não amam os que lhe batem na face, segundo o evangelho".

Esse tema da pobreza, para quem é cristão, é sinônimo de muita reflexão, de muita oração, de muita conversão. E o prêmio é a liberdade. A liberdade para evangelizar. Quem não é pobre de espírito, quem ainda é avaro, não tem como pregar o evangelho. É preciso que sejamos livres dos bens da terra a ponto de partilhá-los, e só depois de partilhá-los seremos livres para evangelizar.

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