Poucas vezes Jesus fala do amor que devemos ter para com Deus

Meditando sobre os Evangelhos, impressiona-nos a mensagem de Cristo, fundada totalmente no amor aos irmãos, na caridade. Poucas vezes, o Divino Mestre fala do amor que devemos ter para com Deus. Do Pai, Ele sempre no-Lo apresenta como o doador de tudo, que nos ama a ponto de dar o Filho à morte para a salvação dos homens. Raras vezes, e foram sempre respostas aos fariseus e aos legistas, em que reafirmou o primeiro mandamento do amor a Deus, mas, logo, a seguir completa-o o amor ao próximo, que lhe é semelhante. Ilustra-o na Parábola do Bom Samaritano (cf. Lucas 10, 25-37).

As cartas do apóstolo João insistem no mesmo diapasão. Catequeticamente, e com clareza apostólica, afirma que aquele que diz amar a Deus e não ama a seus irmãos é mentiroso. E continua que é muito fácil proclamar que amamos a Deus, a quem não vemos, mas se desprezamos o irmão que está a nosso lado, onde está a caridade, onde está o amor? (cf. 1Jo.4,20).

Paulo, na sua Carta aos Coríntios (cf. I Coríntios 13), proclama e exalta a caridade. Quase sabemos de cor o texto maravilhoso. Somos levados a interpretar esse hino como o amor ao Pai Celeste. Mas, o apóstolo fala é da excelência do amor entre os irmãos. “Ainda que eu falasse todas as línguas dos anjos, ou tivesse toda a ciência, sem a caridade seria um bronze que soa” e cujo som se perde nas quebradas dos montes.

Logo a seguir nos ensina em que consiste a caridade: na paciência, na humildade, no fazer o bem, na longanimidade, na partilha da dor e da alegria com os irmãos, no perdão tão difícil. E conclui pela perenidade do amor e da caridade. Tudo cessa quando vier a perfeição, exceto a caridade, pela qual seremos medidos.

No dia do Juízo, quando o Filho do Homem, na Sua glória, vier nos julgar, escreve o evangelista Mateus, Ele não nos questionará sobre o amor de Deus, sobre a nossa fé, sobre as coisas grandiosas que tivermos feito. O questionamento e a glória decorrente será sobre o nosso coração, se ele se abriu ou fechou sobre os pequeninos, que moravam em nossas casas, no nosso bairro, na nossa comunidade.

Nos primeiros hinários depois do Concílio, cantávamos: “Como posso ser feliz, se ao pobre, meu irmão, eu fechei o coração, meu amor eu recusei! Já nesta vida mortal, podemos sentir as delícias desta vida fraterna, como rezamos nos salmo: ó quão bom e quão e alegre, a vida comum entre os irmãos”.

Não é fácil o exercício dessa caridade, o empecilho do pecado que herdamos de Adão leva-nos a outro tipo de vida. Conhecedor da natureza humana, Jesus, no Sermão da Montanha, nos dá regras práticas de sua vivência.

Os bem-aventurados do Reino não são os poderosos e sábios, mas aqueles que vivem o despojamento total da autoconfiança, na simplicidade de espírito. Não é a letra da lei que importa: “Ouvistes o que foi dito aos antigos [...]” e repetindo os mandamentos, dá-lhes o sentido vivencial pleno, exemplificando nos atos que devem nascer do coração renovado (cf. Mateus 5, 17-47).

Enquanto vigorava a lei de talião: dente por dente, olho por olho, ensinava a grandeza do perdão, que reitera na resposta a Pedro, logo no início do discurso eclesiástico, no Evangelho de Mateus (cf. Mateus 18,21-22).

Neste mesmo capítulo 18, na parábola do devedor implacável, diz-nos como seremos tratados se não perdoarmos, de coração, ao irmão. E como se não bastasse a Sua Palavra, deu-nos o Seu exemplo: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” e entregou-se por nós na cruz.

Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora - MG

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